Esqueça atletismo, natação, judô ou vela. No Pan de Guadalajara, programado para o próximo mês de outubro, é da patinação artística que vem uma das grandes esperanças do Brasil em conquistar a medalha de ouro. Trata-se do gaúcho Marcel Sturmer, atual bicampeão pan-americano e medalhista em Mundiais, que no último final de semana garantiu sua vaga na disputa mexicana ao conquistar a medalha de ouro no Pré-Pan, título inédito em sua carreira. E os torcedores que aproveitem para apreciar os últimos momentos do show: aos 25 anos, o gaúcho de Lajeado pretende encerrar a carreira de atleta no final deste ano, após o Mundial de novembro, que será disputado em Brasília. Depois, um período de descanso antes de embarcar de vez no mundo das apresentações por entretenimento, com o qual ele já está envolvido há três anos. Para os próximos meses, ele pretende trazer alguns dos melhores patinadores do mundo para shows em Porto Alegre e em São Paulo.
Mas há algo que pode mudar os planos de Marcel: um novo convite do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) para apoiá-lo na transição para a patinação no gelo, algo que o permitiria participar das Olimpíadas de Inverno. Comentarista da Rede Record durante a realização dos Jogos de Vancouver-2010, ele negou a proposta logo após o Pan do Rio de Janeiro por julgar que não conseguiria desfrutar tanto dos benefícios daquele ouro. Agora, de acordo com ele, tudo depende “de se sentir em paz para começar um novo desafio”.
Em entrevista exclusiva para ao R7, Marcel revelou seus planos de deixar as pistas, além de falar das expectativas para os próximos Jogos Pan-Americanos. Uma competição que, diz o brasileiro, não o faz só crescer como atleta, mas também como pessoa. Confira:
R7 - O que você achou do seu desempenho no Pré-Pan? Foi dentro do esperado para esta época do ano ou poderia ser melhor?
Marcel Sturmer - Eu sou bem perfeccionista e sempre acho que dá para fazer melhor. Essa época do ano é o que chamamos de off season, onde não estamos na temporada de competições internacionais. Nosso calendário nem começou. Normalmente, primeiro faço o Campeonato Gaúcho, depois do Brasileiro, o Sul-Americano, Copa do Mundo e vai subindo até chegar o Mundial.E, desta vez, já começamos o ano com o Pré-Pan, nem teve Campeonato Gaúcho ainda. Então é um campeonato à parte e a gente não tem muito controle sobre o que vai acontecer.
Mas eu consegui treinar super bem. Logo depois do Mundial de Portugal no fim do ano passado, não tive férias: fiz vários espetáculos, que me ajudaram a continuar na ativa. Foram cerca de 40 shows e depois disso eu já emendei o treinamento direto. Passei as férias treinando. Só tive três dias mesmo em que fui para a praia. Tudo para fazer com que eu me apresentasse da melhor maneira possível no Pré-Pan e trouxesse essa medalha para o Brasil.
R7 - E vale a pena você deixar as férias de lado por causa do esporte, por causa dos Jogos Pan-Americanos?
Sturmer - Com certeza. Esse é o meu sonho desde criança. Então, cada vez que eu me sinto um pouco cansado, um pouco enjoado eu me lembro disso e tento fazer despertar essa criança, que sempre amou tanto a patinação e quis essa vida que eu tenho hoje.
R7 - Você já é bicampeão pan-americano. Qual a sua motivação para continuar disputando uma competição na qual você já provou o seu valor?
Sturmer - Boa pergunta
R7 - Quem serão seus maiores rivais no Pan de Guadalajara?
Sturmer - Os de sempre: Argentina e Estados Unidos. Na patinação, diferente de alguns esportes no Pan, os países do continente são fortes. No último Mundial, eu fiquei em terceiro e o argentino em segundo. Então, os melhores também estarão lá. Não será fácil.
R7 - Como deve ser o seu planejamento até outubro?
Sturmer - Não tenho tudo certo na minha cabeça como vai ser daqui até lá. Tenho ideias e tal: devo passar o meu tempo entre Porto Alegre e fazendo alguns intensivos fora do país, mas não defini ainda para onde vou viajar nem qual treinador vou trabalhar.
R7 - Você se vê como um dos favoritos ao ouro nos Jogos Pan-Americanos?
Sturmer - Nos Jogos Pan-Americanos sempre têm dois ou três favoritos. Não é porque eu ganhei outras duas vezes que eu vou ser o super favorito. Tudo bem que vai ter a pressão e seria ridículo eu falar que vou treinar o ano inteiro como um cachorro para chegar e perder. É um fato que eu quero ganhar, mas não depende de mim saber se eu sou o favorito, não sou eu quem faço essa lista. E não quero saber porque acho que ela só vai me prejudicar.
R7 - Como você lida com esta pressão, que vem até mesmo de você?
Sturmer - É muito difícil, mas eu lido com pressão desde criança. A pressão pode ser de diversas naturezas e eu já estou bastante treinado, mas te confesso que para o Pré-Pan foi uma coisa mais estranha. Não sei o porquê eu senti um peso maior, talvez por estar com 25 anos, por este ano o Mundial ser no Brasil e, se todos os resultados for como eu esperar, por pretender encerrar a minha carreira. Cada vez agora que eu paro na pista fico pensando ‘Meu Deus, é o meu último Pré-Pan, minha última Copa dp Mundo...’, pois é o que eu sei fazer, faço desde criança e sou um dos melhores do mundo. É um momento bonito, mas também delicado.
R7 - Por que você quer encerrar a carreira com somente 25 anos?
Sturmer - É um esporte maçante porque é individual. Não tenho um time que treina por mim quando eu estou um pouco mal ou que vai marcar o gol quando eu estiver com dor no joelho. É tudo eu. Eu que tenho que estar todo dia na pista, eu que tenho que levantar o ferro na academia todos os dias, eu que tenho que ganhar o campeonato basicamente sozinho.
Também estou em um momento no qual gosto tanto de competir como de fazer shows. Há três anos, comecei a me inserir no mundo do espetáculo fazendo uma turnê no Rio Grande do Sul. Agora, faço show no país todo e principalmente na Europa. Cada vez gosto mais de fazer isso porque é tão divertido quanto, mas não tem pressão. É só coisa boa. Já tive que dizer ‘não’ a muitas coisas porque estou muito envolvido nos treinamentos.
R7 - E o lado financeiro também pesou?
Sturmer - É complicado falar disso porque não sou parâmetro na patinação brasileira em questões financeiras. Já conquistei Jogos Pan-Americanos, fui o primeiro a ganhar medalha em um Mundial, então os patrocínios vieram. Não foi nada fácil, mas aconteceu. Sou patrocinado, porém, não é igual a países do Primeiro Mundo. A gente não tem a mesma estrutura de treino que esses atletas. Outro meio que eu quero figurar depois é assessorar atletas da patinação, poder ajudá-los a trilhar o caminho que eu trilhei. Ganhei os campeonatos, mas acho que tive bastante sorte...
R7 - Sorte? Existe sorte no esporte de alto rendimento?
Sturmer - Não no desempenho, mas de ter patrocínio, de ter conseguido aparecer na mídia. São coisas que você não controla. O que eu posso fazer é treinar e ganhar campeonatos. Tem várias áreas que eu queria atuar, mas principalmente na arte. Tanto na patinação quanto em outras artes.
R7 - Imediatamente após a sua aposentadoria seria esse negócios de shows mesmo?
Sturmer - Isso. E daí eu vou estudar o que aparecer e o que eu quero fazer. Logo no primeiro ano eu devo me ficar em duas coisas: fazer o maior número de shows que eu puder e, parece loucura falar isso, mas descansar. Quero descansar pelo menos por meio ano, pois eu treino demais. As maiores férias que eu tive foram quando eu me machuquei. Aí eu até ficava me perguntando se não era o meu corpo que tinha se “auto-machucado” para poder descansar e parar um pouco
Começou com 6, Brasileiro com 9 anos foi para a seleção. Primeiro titulo internaci9onal, 12 , sul–americano. “Foi um piscar de olhos até hoje”.
R7 - Você deve usar a mesma coreografia tanto no Pan quanto no Mundial?
Sturmer - O que eu vou apresentar no Pan eu vou apresentar no Mundial. Não tem como treinar, pois na patinação você tem que fazer duas coreografias, a do programa longo e do curto. Então, seriam quatro para treinar. Então, é melhor fazer duas e focar para fazer tudo certinho e assim conquistar as duas medalhas com que eu tanto sonho.
R7 - Você já pensou em mudar para a partinação no gelo e disputar uma Olimpíada de Inverno?
Sturmer - Não vou mentir: isso já passou pela minha cabeça e até o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) já fez um convite. Só que esses convites sempre vêm em uma época complicada, como logo após um Pan. E aí é complicado largar algo que tu sempre sonhou fazer por algo que você não sabe se vai ser tão bom quanto. Depois do Rio-2007 eu estava colhendo os louros de uma adolescência que eu não vivi para trocar por algo incerto.
R7 - Tem gente que deve pensar que patinação no gelo e na pista é a mesma coisa...
Sturmer - Ao mesmo tempo que existem muitas similaridades, existem muitas diferenças. Os saltos e os giros são todos iguais, mas o patins e o atrito da pista é totalmente distinto. Se eu fosse para o gelo, era óbvio que eu não seria um patinador medíocre, só que eu não sei o quanto bom eu conseguiria ser. Será que seria no nível de ir para uma Olímpiada? Mas... quem sabe? No gelo a longevidade do atleta é maior e, se eu receber uma proposta no fim do ano e me sentir em paz, não tem um porquê eu não tentar. Só não queria interromper algo que está em andamento.
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